O segredo de justiça tem estado no centro de algumas das mais acesas questões a envolverem os mundos da política, do jornalismo e do poder judicial. Foi ontem abordado em Coimbra.Eduardo Dâmaso, director adjunto do Diário de Notícias, foi ontem o convidado do Tribunal da Relação de Coimbra em mais uma sessão das Jornadas da Secção Criminal, que levou a debate o tema "Direito à informação. Segredo de justiça. Tensão e perspectivas".
"Vítima" confessa de uma lei que considera ferida de alguma – quando não muita – perversidade, o jornalista é uma das vozes reconhecidamente mais autorizadas numa matéria que hoje divide a classe e continua a levantar a mais acesa controvérsia entre os diversos actores num palco onde se encontram a justiça, a política e o jornalismo.
Ontem, Eduardo Dâmaso começou por fazer um enquadramento histórico da evolução deste tipo de crime em Portugal, tendo em conta a sua actual "dimensão social e política" e remetendo-o a uma realidade a que chamou "judicialização da política".
Fenómeno típico das sociedades meridionais – com uma espécie de "pré-história" na "operação mãos limpas", em Itália, que terá criado algum mimetismo a diversos níveis, especialmente em alguns países europeus –, em Portugal o segredo de justiça iniciou a sua fase "ascendente" na sequência da "aliança estruturante" que uniu PS e PSD ao longo dos anos 80 e 90 e durante os quais se registou "uma grande eficácia do sistema judicial em relação aos crimes contra as pessoas".
Nesta altura, já em plenos anos 90, de acordo ainda com Eduardo Dâmaso, quando as televisões privadas em início de carreira protagonizaram as primeiras violações "grosseiras" do segredo de justiça, porque se tratava de casos como o de tráfico de droga em bairros como o Casal Ventoso, com um qualquer "zé da esquina", ninguém estava muito preocupado com a violação do segredo de justiça.
Problemático, para o director adjunto do Diário de Notícias, começou a ser o momento em que o tipo de criminalidade perseguida deixou de ser a que "não incomodava politicamente" para ser aquela relacionada com os primeiros desvios conhecidos às ajudas comunitárias. E, aí sim, "quem falava de corrupção, era logo acusado de antipatriotismo"... Pelo que a solução passou a ser a aplicação, pela malha mais apertada, da lei do segredo de justiça.
Por este raciocínio, não espanta a conclusão de que "o segredo de justiça não tem muito que ver com os direitos das pessoas".
E por essa razão, Eduardo Dâmaso considerou "fundamental o debate" à volta do segredo de justiça – que não tem sido feito –, tendo sempre em conta a necessidade de "olhar para os actores deste debate e para as suas reais motivações".
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