Ainda as férias
O Conselho Superior da Magistratura, no folhetim criado pelo Governo a propósito das férias judiciais, tomou posição sobre duas matérias de especial importância: a substituição dos juízes que se encontrem no gozo de férias entre 15 e 31 de Julho e a questão da competência para despachar os processos urgentes no período de férias judiciais, de 1 a 31 de Agosto.
A tomada de posição do Conselho Superior da Magistratura tem a enorme vantagem de esclarecer os juízes sobre os procedimentos a adoptar neste primeiro ano da Nova Era dos Tribunais, evitando conflitos - negativos ou positivos - de competência.
A decisão do Conselho Superior da Magistratura pode, no entanto, revelar-se inadequada, salvo melhor opinião, por motivos de ordem política e técnica.
Por um lado, será difícil explicar aos cidadãos porque razão, no período compreendido entre 15 e 31 de Julho, a substituição legal abrange apenas os processos urgentes. Se o objectivo do legislador foi assegurar uma maior produtividade dos Tribunais, então seria lógico que a substituição o fosse para todo o serviço. Além disso, a substituição legal está prevista para todos os processos - urgentes ou não -, exceptuando os casos em que o substituto não é juiz de carreira – cfr. art.º 68.º, n.º4 a contrario da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, aprovada pela Lei n.º 3/99 de 13 de Janeiro.
Por outro lado, no que respeita ao período de férias judiciais - de 1 a 31 de Agosto -, tendo o Conselho Superior da Magistratura decidido que é o juiz de turno o competente para decidir os processos urgentes, qual é a actividade que os juízes que não se encontrem de férias nesse período - ou em parte desse período - vão desenvolver? Nenhuma! Os processos urgentes são conclusos ao juiz de turno, os processos não urgentes não são movimentados e as diligências - com excepção das realizadas em processos urgentes pelo juiz de turno - não se realizam. Dirão que o juiz poderá despachar os processos mais complexos que não teve tempo para despachar até 31 de Julho ou que poderão aproveitar o tempo para actualizar conhecimentos. Porém, nem todos os juízes chegam a 31 de Julho com processos por despachar e quanto à actualização de conhecimentos, constituindo uma obrigação de todos e cada um dos juízes, dificilmente se compreenderá, no quadro legal vigente, que possa justificar uma suspensão de trabalhos - elaboração de despachos ou sentenças - por parte dos juízes.Parece, por isso, que melhor seria que o serviço urgente fosse assegurado pelo juiz de turno com excepção daquele que o juiz titular pudesse despachar por não se encontrar no gozo de férias. É certo que a lei prevê – cfr. art.º 31., n.º 1 do Regulamento da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 186-A/99 de 31 de Maio, alterado pelos Decretos-Lei 290/99 de 30 de Julho, 178/2000 de 9 de Agosto e 246-A/2001 de 14 de Setembro - que no período de férias judiciais os processos urgentes são despachados pelo juiz de turno. No entanto, sendo tal norma anterior à Lei n.º 42/2005 de 29 de Agosto que, entre outras matérias, veio alterar o regime das férias judiciais, deve aquela norma ser interpretada à luz destas alterações sob pena de se esvaziar de conteúdo a nova lei e as modificações que a mesma introduziu na forma de funcionamento dos Tribunais.
Além disso, se é verdade que a decisão do Conselho Superior da Magistratura vincula todos os juízes, também é verdade que não vincula as partes no processo. E não custa nada imaginar as partes a arguirem a nulidade de decisões judiciais por violação do princípio do juiz natural em todos os casos em que o juiz titular não se encontre no gozo de férias e o processo seja despachado pelo juiz de turno. (Link)
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A nova agenda dos juízes
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Temos mais de trinta anos de democracia e verdadeiramente não podemos reclamar a autoria de nenhuma reforma fundamental do sistema de justiça. Donde decorre, que, aos olhos dos nossos concidadãos, sejamos vistos como cúmplices e interessados no seu evidente mau funcionamento. O que, por não ser verdade, precisa de ser mudado.
A representação sindical dos juízes, que começou por fazer todo o sentido na época histórica em que surgiu, e que teve a sua importância na preservação dos valores da independência (incluindo também o aspecto relevante das condições materiais para o exercício da função), perdeu há muito, do meu ponto de vista, sentido estratégico e utilidade prática. Mas a verdade é que essa aposta persistiu fazendo o seu caminho, baseada na ilusão de que por essa via os juízes conseguiriam obter melhores condições para exercer a sua função e, assim, por reflexo, exercê-la melhor. Ilusão que se desfez, quando, esgotadas todas as possibilidades do discurso voluntarista e reivindicativo, no fim desse caminho, os juízes perceberam que não há lá nada e que essa via não tem saída. Donde, está bom de ver, para avançar agora, vai ser preciso voltar um pouco atrás e começar de novo.
Precisam os juízes, pois, colectivamente, de uma nova agenda política.
Afirmar em primeiro lugar, sempre, a cultura da exigência. Em todos os aspectos organizativos, funcionais e de comportamento, os juízes têm de ser os primeiros a exigir de si próprios um desempenho situado num patamar de excelência e de encontrar forma de isolar aqueles (pouquíssimos, felizmente) que, não querendo corresponder a tais expectativas, degradam a imagem e prestígio da justiça.
Depois, não menos importante, intervenção cívica e visibilidade social. A funcionalização burocrática, que esconde os juízes na sombra dos gabinetes, atrás dos processos, é contrária a uma justiça capaz de afirmar os valores da cidadania e dos direitos humanos.
Também, ainda, uma aposta clara e prioritária na eficiência dos tribunais. Do lado das reformas, com abertura, disponibilidade e interesse, e não contra toda a mudança - esse conservadorismo tão típico dos tribunais. Tomando a dianteira de avançar com propostas de solução dos estrangulamentos do sistema, de forma positiva e construtiva. Não por razões estratégicas de melhoria da imagem social dos juízes. Mas porque essa é a nossa responsabilidade.
E, finalmente, talvez o mais importante: respeito e dignidade. O relacionamento dos juízes com os governantes, num espaço comum que é o da organização política do Estado, deve basear-se sempre, mutuamente, em padrões de grande respeito institucional e correcção formal e substancial. Valores que condicionam directamente a imagem e prestígio dos tribunais. Por isso, importa colocar esse diálogo institucional num patamar de normalidade e desdramatização. Com memória, mas sem ressentimentos inúteis e inconsequentes.
(...)
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