O VII congresso dos juízes e o anúncio formal da construção do novo aeroporto da Ota representaram dois dos piores momentos do governo.
Os juízes deram uma lição a Alberto Costa, olhos nos olhos, com respeito e determinação.
Perante um ministro da Justiça politicamente fragilizado, a mensagem dos juízes foi clara e implacável: «A independência do poder judicial é inegociável».
Não se deixando intimidar por soundbytes e por medidas avulsas, como a limitação das férias judiciais, os magistrados judiciais assumiram-se, com toda a legitimidade, como titulares de um dos três pilares da democracia.
Os juízes deram uma prova cabal de que a propalada reforma da Justiça não se fará à custa de um poder judicial domesticado, seja qual for a maioria no poder.
Dias antes de assistir a uma troca de acusações inéditas entre o governo e os magistrados judiciais, o país inteiro também assistiu a uma campanha publicitária de Estado sem precedentes, a propósito da construção do novo aeroporto.
O governo apresentou novos estudos técnicos, com pompa e circunstância, para tentar justificar a opção já tomada anteriormente de construir na Ota uma infra-estrutura aeroportuária, de mais de três mil milhões de euros.
Tal como aconteceu com a Expo’98 e o Euro 2004, não faltou o coro afinadinho dos que garantiram que o novo aeroporto não vai pesar nas contas públicas.
Não está em causa a eventual justeza técnica da opção. Nem tão pouco os efeitos positivos em termos de criação de novos empregos.
O que está em causa é bem mais importante: o processo que culminou com o anúncio da construção do novo aeroporto na Ota é um dos mais graves atentados aos princípios de transparência da vida democrática.
O braço-de-ferro com os magistrados e o anúncio da construção do novo aeroporto padecem do mesmo mal: José Sócrates confunde legitimidade eleitoral com manipulação grosseira da opinião pública.
O resultado está à vista. A prometida reforma da Justiça continua a ser uma miragem e o processo de decisão da construção do novo aeroporto reforça todo o tipo de especulações e suspeições sobre o governo.
Certamente, não é por acaso que, entre os militantes e simpatizantes socialistas, ainda que em surdina, se começa a ouvir que é preciso eleger um Presidente da República de uma cor política diferente da actual maioria.
Rui Costa Pinto, in Visão Online
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