A reformulação do mapa judiciário vai avançar, mas o Ministro da Justiça não revelou ainda o «desenho», destacando apenas “mais flexibilidade”. A revisão prevê o fim das comarcas que, segundo Alberto Costa, mais de um terço têm menos de 500 novos processos por ano. O ministro da Justiça salientou ontem que a revisão do mapa judiciário, que prevê o fim das comarcas como unidade de referência dos tribunais, vai conferir “uma nova flexibilidade ao emprego de meios humanos”, incluindo magistrados e funcionários. “É preciso conferir uma nova flexibilidade ao emprego de meios humanos”, disse Alberto Costa à saída da sessão de abertura do debate público sobre o novo mapa judiciário, no âmbito do programa «Thémis XXI: A Imagem da Justiça», que decorreu em Lisboa. Segundo o ministro, além da reorganização territorial dos tribunais, que vão obedecer a uma nova unidade de referência “mais ampla” e repartida em cinco grandes áreas do país, a reforma implicará um novo modelo de gestão, com pessoas capazes de “resolver problemas” ligados aos recursos financeiros e humanos. “O objectivo é mais eficiência, mais economia, mais flexibilidade”, disse Alberto Costa, acrescentando que esta reforma será “sempre um ganho para os contribuintes”.
Na sua perspectiva, não se podia continuar a aumentar o número de comarcas, de funcionários, de juízes e de magistrados do Ministério Público, sendo altura de rever “estruturas e conceitos herdados do século XIX”. Alberto Costa justificou ainda a reforma, dizendo que as comarcas como unidade de referência ficaram “paradas” no tempo, quando o país mudou, em termos demográficos e sociais, e o sistema de Justiça já não tem como destinatários “personagens de romances de Júlio Dinis”.
“Oportunidade de ouro”
Questionado se tais mudanças, com a supressão das comarcas como unidade de referência, não irá provocar protestos das populações e do poder local (autarquias), o ministro disse esperar um “grande apoio” a esta reforma, embora reconheça que “qualquer reforma a sério encontra resistências e incompreensões”. “Não poderão ser resistências a impedir o que tem de ser feito pela modernização do país”, disse, notando que o modelo organizativo dos tribunais assente na comarca, agora à beira do fim, remonta ao tempo de Mouzinho da Silveira. Para o governante, a reforma do mapa judiciário é ainda uma “oportunidade de ouro” para se implementar uma gestão mais racional e eficaz do sistema judicial.
“O mapa judiciário vai obedecer a uma nova unidade de referência, que não as comarcas, e que permitirá reunir mais meios humanos e materiais para dar uma resposta mais qualificada e flexível, melhorando a qualidade dos serviços prestados”, disse o ministro num encontro com os operadores judiciários.
Racionalização de meios
Para o governante, a reforma visa objectivos de racionalização de meios e um melhor acesso à justiça. Para justificar esta alteração da unidade de referência (as 233 comarcas existentes), Alberto Costa disse que 54 por cento das comarcas têm uma média de entrada de processos inferior a mil por ano e destas mais de um terço têm uma média inferior a 500. Na sua perspectiva, “não é possível suportar os custos destas unidades judiciais com pouca pendência processual”. “O novo mapa vai procurar uma diferenciação de respostas e uma maior especialização dos tribunais, com um conjunto diferenciado de soluções à escala da nova unidade de referência”, acrescentou. A nova reorganização territorial dos tribunais pretende ainda libertá-los dos assuntos supérfluos, apostando-se nos meios extra-judiciais de resolução de litígios, como os julgados de paz. “Esta deve ser uma verdadeira reforma e não um arranjo, um retoque num sistema judicial herdado do século XIX, o que implica a supressão de comarcas em vez de seguir a lógica de se ir acrescentando”, frisou. A nova divisão territorial do mapa judicial assentará em circunscrições mais alargadas, que deverão corresponder às delimitações territoriais utilizadas para a distribuição de fundos comunitários, as chamadas NUT III (Nomenclaturas Unitárias Territoriais).
Agilização
No debate intervieram ainda a directora geral da Administração da Justiça, Helena Ribeiro, e Conceição Gomes, do Observatório Permanente da Justiça Portuguesa, que tem em curso um estudo sobre o novo mapa judiciário. Helena Ribeiro também falou nas vantagens da reforma em termos de “agilização de meios” e fez um historial sobre as comarcas judiciais, que, neste momento, são 233. “Muitas das comarcas foram criadas por pressão do poder político, designadamente do poder local”, recordou. Conceição Gomes reconheceu que a reforma do mapa judiciário é “necessariamente complexa”, obedecendo a uma “radiografia económica, social e demográfica” do País.
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Governo
Circunscrições
O secretário de Estado adjunto da Justiça afirmara na passada terça-feira que o mapa judicial nacional ficará reduzido a 30 circunscrições, desaparecendo as actuais comarcas, círculos e distritos judiciais até ao final do ano. Conde Rodrigues explicou que esta é a proposta do Governo para a reorganização do mapa judicial e do novo modelo de gestão dos tribunais, que deverá entrar em vigor até ao final do ano. De acordo com o secretário de Estado, o modelo está ainda dependente de sugestões, mas certo é, para já, o desaparecimento das actuais circunscrições: comarcas, círculos e distritos judiciais.
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Distanciamento
O presidente do Sindicato dos Funcionários Judiciais considerou “importante” a reforma do mapa judiciário, mas criticou um eventual maior distanciamento geográfico dos tribunais em relação aos cidadãos. “Retirar os tribunais de junto das populações (com a supressão das comarcas) não é positivo. Compreendo a necessidade de rentabilizar o sistema e diminuir custos de funcionamento, mas por outro lado há o custo de retirar a proximidade da justiça dos cidadãos”, disse Fernando Jorge. O presidente do SFJ admitiu que esta proximidade dos tribunais em relação às populações passa também por uma avaliação da rede de transportes e outras acessibilidades.
Realidade social
O presidente da Associação Sindical dos Juízes Portugueses manifestou «abertura de espírito» da classe para a reforma do mapa judiciário, mas sublinhou que esta deve corresponder à “realidade social, económica e conflitual” do País. António Martins referiu que os juízes são os primeiros a reconhecer que a orgânica judiciária de hoje “não responde às necessidades da justiça e dos tempos actuais”, havendo “abertura de espírito e maleabilidade suficiente para encarar a reforma” do mapa dos tribunais.
Para Espanha «não»
O presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público alertou, a propósito da supressão de comarcas devido à reforma do mapa judiciário, que “em matéria de Justiça não se podem mandar os cidadãos para Espanha”. “Quando se fala de extinção e concentração de meios haverá sempre que pensar também em proximidade e na capacidade indutora dos serviços existentes na concretização dos direitos”, disse António Cluny, ao intervir no debate público sobre a revisão do mapa dos tribunais.
In O Primeiro de Janeiro
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