«Os tribunais cíveis vão deixar de ter processos em papel a partir do próximo ano, depois de implementada uma nova aplicação informática que permitirá o armazenamento dos documentos em computador, anunciou o secretário de Estado da Justiça.
A iniciativa do Ministério da Justiça, avançada hoje pelo Jornal de Notícias, visa acabar com os volumes de papel que se amontoam nos tribunais portugueses e que constituem cerca de 80 por cento dos processos existentes.
O secretário de Estado da Justiça, João Tiago Silveira, declarou ao JN que o fim dos processos em papel vai ser possível depois de os tribunais assimilarem uma nova aplicação informática - chamada Citius - que vai ser hoje posta a funcionar a título experimental no Tribunal de Vila Nova de Gaia. Para já, a iniciativa diz respeito somente aos procedimentos de dívidas.
«Durante 2007, todas as peças processuais referentes a acções declarativas e acções executivas podem ser enviadas para os tribunais por via electrónica, sem necessidade de mais procedimentos», disse João Tiago Silveira ao jornal.
O secretário de Estado da Justiça disse que «actualmente, os advogados e solicitadores podem enviar as peças e requerimentos por correio electrónico, mas isso não dispensa a obrigatoriedade da entrega física dos próprios documentos».
«O trabalho ficará muito menos burocrático. Os requerimentos de injunção passam a ser enviados pela Internet, assim como o próprio pagamento de taxa de justiça. Depois os advogados e solicitadores são notificados do andamento do processo através de correio electrónico», disse o secretário de Estado.
Segundo João Silveira, esta iniciativa será alargada a todos os tribunais até ao final do ano e depois decorrerá a implementação da mesma receita relativamente aos processos nos tribunais cíveis.
O Ministério da Justiça desenvolveu a aplicação internamente com o Instituto de Tecnologias da Informação da Justiça e a Direcção geral da Administração da Justiça, em vez de recorrer a empresas externas. João Tiago Silveira disse ao JN que o custo do programa informático Citius oscila entre 500 mil a um milhão de euros.»
Comentário:
Citius (et altius et fortius): um esforço olímpico?...
A desmaterialização completa dos processos cíveis envolve um conjunto de dificuldades técnicas que devem ser de difícil solução, incompatível com o investimento de, "apenas", um milhão de euros:
a) os servidores informáticos instalados nos tribunais não têm capacidade para gerir e armazenar o volume de informação que a desmaterialização dos processos implica;
b) os monitores dos computadores, existentes na generalidade dos tribunais, não têm dimensão, nem qualidade adequada ao trabalho, num contexto de desmaterialização dos processos, a qual implica uma utilização mais intensiva e prolongada de tais equipamentos, sendo ainda aconselhável uma resolução de imagem que permita ver, integral e simultaneamente, pelo menos, o equivalente a duas folhas A4;
c) os tribunais vão ter de adquirir scanners em número e qualidade compatível com as tarefas que a desmaterialização dos processos implica;
d) será necessário assegurar a devida manutenção técnica dos equipamentos - questão aparentemente simples, mas que ainda não foi resolvida nos tribunais -;
e) as infraestruturas de comunicação existentes nos tribunais ainda não permitem um tráfego de informação compatível com tal desmaterialização;
f) a desmaterialização dos processos vai exigir protocolos de segurança e de redundância;
g) a desmaterialização dos processos vai exigir acções de formação para todos os intervenientes processuais;
Por outro lado, os advogados vão confrontar-se com novas dificuldades técnicas: por exemplo, como vão poder digitalizar documentos de dimensão superior a A3 (por exemplo plantas de arquitectura e mapas)?
Por tudo isto, será necessário um esforço olímpico para superar todas as dificuldades.
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Comments

1 Response to 'Citius post habilus'

  1. Anónimo
    http://lexfundamentalis.blogspot.com/2006/07/citius-post-habilus.html?showComment=1154042340000#c115404238021811209'> 28 julho, 2006 00:19

    Com o devido respeito ao "comentário", o problema da desmaterialização do processado está bem patente nos Tribunais Administrativos e Fiscais espalhados pelo país.
    Mas o problema é solucionavel?
    Penso que não:
    1 Apesar de scaners que digitalizam 50 folhas por minuto, mais ou menos;
    2 Apesar de haver "fluxos" que dão entrada do processo digital, com conclusão, no computador do Juiz;
    3 Apesar de haver cartões que funcionam como chaves digitais;
    4 Apesar de haver já modelos de documentos para os funcionários os subescreverem no cumprimento dos despacho;
    5 Apesar de haver funcionários a prestar apoio formativo;
    6 Apesar de funcionários a averiguar das anomalias técnicas; existem e
    O certo que que existem dois tipos de processo: o físico e o digital.
    Porquê?
    Porque os magistrados e os funcionários precisam de desfolhar o processo, porque a leitura do processo digital, por um lado, não possibilita a confrontação de páginas e, por outro lado, o processo digital, actualmente, porque a tecnologia ainda não o permite, é ficção, que existe no relatório minoritário, não dá capacidade de analisar e ter a certeza da estrutura lógica do processado.
    Ora, nos Tribunais Administrativos e Fiscais existem os dois tipos de processos e para sustentar essa actual ideia da desmaterialização dos processos gastam-se recursos que triplicam o valor do processo físico.
    Alguns, sim, ganham.
    Ou seja, numa conclusão rápida, mais uma aventura, cujo resultado positivo acontecerá nas calendas gregas.