O presidente do Metropolitano de Lisboa, Mineiro Aires, entregou uma obra a uma empresa, também detida a 100 % por esta empresa pública, que, por sua vez, subcontratou uma outra fundada pelo próprio gestor - mas que abandonara antes de assumir a presidência do Metro.
Confuso?
Seguramente. Ilegal?
Talvez sim, talvez não.
Seria a única empresa capaz de fazer o trabalho necessário? Seria imprescindível que o presidente do Metro participasse na decisão? Mesmo que não participasse não iria a obra parar à mesma empresa? Não teria de ser feito concurso público?
Enfim, perguntas que há muito se repetem neste ciclo infernal que é o da triangulação de interesses entre empresas públicas e privadas com os gestores pelo meio.
Este episódio reflecte um dos piores sintomas da doença que há anos mina a democracia e que, se em primeira linha deixou a classe política na linha de fogo, tem poupado essa intocável classe que é a dos gestores de empresas públicas. Falamos da opacidade de decisões de gestão importantíssimas construídas a coberto de uma fina camada de verdade formal, ou mesmo sem ela, que tem conduzido a uma inaceitável vampirização de recursos públicos. É isto que destrói a confiança dos portugueses nas suas instituições, é isto que constrói um país em que metade dos portugueses vive desconfiado da outra metade. São coisas destas que criam um sentimento genérico, ainda que, por vezes, demasiado difuso, de que há verdadeiramente uma classe de gente "poderosa" que sobretudo encontra no Estado uma forma de tratar de si própria e não de servir a imensa e maioritária multidão mergulhada na vidinha quotidiana, que tudo paga, que só encontra dificuldades.
Não se discute aqui a seriedade do presidente do Metro, porventura terá as suas explicações, mas o processo parece tudo menos simples, parece tudo menos transparente. Decisões como esta ou percursos como o do ex-ministro socialista Pina Moura na transição entre o Estado e as empresas , na manutenção dos dois pés nas empresas e no Parlamento, podem, admitamos, não ser feridos por qualquer ilegalidade mas comportam uma óbvia conflitualidade de interesses. Uma parte dos políticos e dos gestores públicos preferem sempre escudar-se em pareceres, em leis que eles próprios fizeram e votaram, nos inevitáveis alçapões dos processos administrativos. Ficam tranquilos por proclamarem a sua ideia de lei e de ética, mas terão de aceitar também que não nos conformemos com isso. E que não queiramos uma lei que protege interesses de recorte pouco claro.
In DN
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