O Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE) atribuiu entre 2002 e o final do primeiro semestre de 2005, através do Fundo para as Relações Internacionais (FRI), um subsídio superior a 3,7 milhões de euros à MUDIP – Associação Mutualista Diplomática Portuguesa, uma entidade privada cujo objectivo é justamente complementar a reforma e as despesas de saúde dos diplomatas e funcionários internos do MNE, um universo da ordem de 1700 pessoas.

Como o FRI é financiado com as receitas dos emolumentos, documentos pagos pelos portugueses emigrados nos consulados (passaportes, registo de casamentos), significa que os emigrantes estão a financiar indirectamente a comparticipação dos complementos de reforma, saúde e escola dos filhos dos diplomatas.
Desde 2002, a MUDIP, apesar de os diplomatas colocados no exterior terem vencimentos mensais (salário e abonos) entre os nove mil e os cerca de 15 mil euros, é a entidade mais beneficiada com subsídios pelo MNE. Os apoios financeiros, que oscilaram entre 1,2 milhões de euros, em 2002, e 436 mil euros no primeiro semestre de 2005, representaram sempre mais de 31 por cento do subsídio total atribuído.
Ontem, o porta-voz do MNE foi categórico ao CM: “Não lhe posso explicar [a razão pela qual foram atribuídos subsídios tão elevados à MUDIP], porque isso tem a ver com o Governo anterior”. Mesmo assim, Carneiro Jacinto garantiu que “este Executivo não deu nada [subsídios através do FRI]”.
Com os custos dos emolumentos a oscilarem entre um mínimo de 40 e um máximo de 194 euros, Carlos Pereira, presidente do Conselho das Comunidades Portuguesas, considera que “não faz sentido que o dinheiro que nós [emigrantes] pagamos seja dado à Mútua dos Diplomatas”. Porque isso significa que “os emigrantes estão a pagar as reformas dos diplomatas”.
Edmundo Martinho, actual presidente do Instituto da Segurança Social e ex-presidente da União das Mutualidades, explica que, “em geral, só recebem dinheiros públicos as entidades que tenham equipamentos sociais para gerir, por exemplo, lares de idosos, creches, ou acordos de cooperação com a Segurança Social”. O CM tentou ouvir os dirigentes da MUDIP, mas, devido ao recente falecimento do embaixador António Monteiro Portugal, que presidia à MUDIP, uma funcionária desta entidade pediu para “ligar a partir do dia 30 de Março”.
Para Carlos Pereira, não há dúvidas: o subsídio do MNE à MUDIP “é um financiamento público de uma entidade privada”. E remata: “Dizem-nos que não há dinheiro e depois dão subsídios à Mútua dos Diplomatas”.

PRINCIPAIS SUBSÍDIOS DO FUNDO PARA AS RELAÇÕES INTERNACIONAIS
MUDIP - ASSOCIAÇÃO MUTUALISTA DIPLOMÁTICA PORTUGUESA
2002 - 1.238.000 euros, 39,3% do total
2003 - 1.160.000 euros, 47,03% do total
2004 - 930.000 euros, 31,44% do total
2005 - 436.181 euros, 53,5% do total (primeiro semestre)

CENTRO DE INFORMAÇÃO JACQUES DELOR
2002 - 600.000 euros, 19,04% do total
2003 - 540.000 euros, 21,89% do total
2004 - 600.000 euros, 20,29% do total
2005 - 200.181 euros, 25% do total (primeiro semestre)

CENTRO DE ESTUDOS ESTRATÉGICOS E INTERNACIONAIS
2002 - 419.107 euros, 13,3% do total
2003 - 90.000 euros, 3,65% do total
2004 - 120.016 euros, 4,06% do total
2005 - 50.000 euros, 6% do total (primeiro semestre)

TOTAL DO ANO
2002 - 3.150.000 euros
2003 - 2.467.000 euros
2004 - 2.343.000 euros
2005 - 812.260 euros (primeiro semestre)

OUTROS APOIOS
Além das instituições referidas acima existem mais casos curiosos como a Madragoa Filmes, que em 2004 recebeu 50 mil euros. Não foram só as instituições que mereceram apoios, na lista estão ainda nomes de particulares, como é o caso de Tiago Miranda, que em 2002 recebeu três mil euros.

CÔNJUGES RECEBEM 29 MIL EUROS
A Associação dos Cônjuges dos Diplomatas Portugueses (ACDP) recebeu, entre 2002 e 2005, do Ministério dos Negócios Estrangeiros, apoios financeiros no valor de 29 210 euros.
A maior quantia, de 10 500 euros, foi atribuída em 2002, enquanto em 2003 e 2004 a associação recebeu 7500 euros por cada ano. Já em 2005, o valor atribuído no primeiro semestre foi de 3710 euros.
A ACDP foi criada em 1982 para representar e defender os interesses dos cônjuges dos diplomatas e das respectivas famílias.

RELATÓRIO DO FRI "É CONFIDENCIAL"
Os relatórios anuais do Fundo para as Relações Internacionais (FRI) “é confidencial”, diz o porta-voz de Freitas do Amaral. Por isso, não é possível aceder às suas contas. Certo é que o FRI foi criado por Durão Barroso, enquanto ministro dos Negócios Estrangeiros, em 1994. Presidido por Rui Quartin Graça, secretário-geral do Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE), o FRI é também gerido pelo director-geral dos Assuntos Consulares e Comunidades Portuguesas e pelo director do Departamento Geral de Administração.
A actividade do FRI centra-se “no financiamento das acções de formação dos funcionários diplomáticos, na modernização dos serviços externos, bem como no apoio a estudos e trabalhos de investigação relevantes no quadro das relações internacionais”, como diz o Decreto-Lei n.º 59/94. Segundo a lei, a direcção do FRI deve manter o ministro dos Negócios Estrangeiros informado de toda a tramitação e promover a boa gestão deste órgão.
Deve também prestar contas, cujas despesas podem ser de dois tipos: normais e classificadas. Estas últimas são determinadas por despacho do ministro. Em 2003, o Decreto-Lei n.º 257 alargou as competências do FRI, “considerando fundamentalmente três aspectos centrais do programa de Governo para esta área: as comunidades portuguesas, a diplomacia económica e acção de promoção da língua e cultura portuguesas” .
Em 1994, Durão Barroso tinha considerado que estas acções seriam fundamentais para o desenvolvimento da política externa portuguesa no Mundo.
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