As prisões portuguesas podem, a prazo, vir a ficar menos lotadas como consequência da aplicação do Código Penal, cuja revisão já está concluída. É que a proposta de novo texto legislativo alarga para até cinco anos a moldura penal passível de suspensão e incentiva o recurso à prisão domiciliária como pena. Desta forma, se os juízes assim o determinarem, os condenados até cinco anos de cadeia só cumprirão pena se cometerem novo crime no espaço de três anos e os punidos até dois anos podem cumprir pena em casa, sob vigilância de pulseira electrónica.

Além disso, o documento que deverá ser hoje entregue ao Governo pela Unidade de Missão para a Reforma Penal (UMRP), a que o JN teve acesso, institui normas de conduta dos condenados enquanto durar o período estipulado de suspensão das penas e incentiva também o trabalho a favor da comunidade, que é alargado para as penas até dois anos. Depois do Governo, caberá à Assembleia da República aprovar a nova lei.

"Há uma tendência para libertar as prisões e procurar penas alternativas. Porque reconhece-se que a sua aplicação, ao longo de 200 anos, tem sido um fracasso. A prisão não reinsere; por vezes fomenta a própria criminalidade. Além disso, custa muito dinheiro", comenta, ao JN, Germano Marques da Silva, professor de Direito Penal e responsável pelas últimas alterações ao Código de Processo Penal, em 1997.

Nesse sentido, a UMRP dedica um artigo do próximo Código Penal a reforçar o conceito de execução da pena. "A execução da pena de prisão, servindo a defesa da sociedade e prevenindo a prática de crimes, deve orientar-se no sentido da reintegração social do recluso, preparando-o para conduzir a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes", lê-se no artigo 42.º do documento.


Políticos "a salvo" da prisão

As propostas apresentadas pelo grupo coordenado pelo jurista Rui Pereira reforçam também o recurso à pena de multa em substituição da prisão. E o valor mínimo diário de multa aumenta de um para cinco euros.

Da substituição da pena de prisão também poderão vir a beneficiar os políticos com problemas com a Justiça. É que para os funcionários e titulares de cargos públicos está prevista a proibição do exercício de funções públicas entre dois a cinco anos, em vez de condenações até três anos de cadeia. É o que prevê aquele que será o novo artigo 43.º, que coloca nas mãos dos juízes a apreciação sobre a forma "adequada e suficiente" de realizar as "finalidades da punição".


Sucesso nas pulseiras

Germano Marques da Silva, presidente da Comissão de Acompanhamento do Sistema de Vigilância Electrónica, diz que o sistema de prisão domiciliária, com pulseira electrónica, aplicado às medidas de coacção "tem sido um sucesso", pelo que faz todo o sentido alargá-lo às penas. "Devidamente controlados, os condenados até podem trabalhar, o que é importante num país onde a população está a envelhecer e as prisões ficam caras. Em Israel, nos Estados Unidos e na Holanda já está instituída a substituição da pena de prisão", explica o professor.

Quem não vê a prisão domiciliária como boa medida enquanto pena é o advogado Rodrigo Santiago. "Perde-se o efeito disuasor do crime e parece mais uma solução para o Estado não gastar dinheiro. Até do ponto de vista do cidadão, as prisões, porque não são hotéis de cinco estrelas, realizam as finalidades da punição. Não sei se isso se verifica se os condenados cumprirem a pena em casa. Custa-me a aceitar", argumenta, ao JN, o penalista de Coimbra. No entanto, o causídico já considera positivo o alargamento do período possível de suspensão para as penas de cinco anos de prisão. "Só deverão ir para a cadeia os envolvidos no grande criminalidade", defende Rodrigo Santiago.
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