O presidente do Tribunal de Contas (TC), o ex-ministro socialista Guilherme de Oliveira Martins, revela ao Expresso de hoje que estão previstas mudanças no funcionamento da instituição em 2006, com maior responsabilização de quem aplica dinheiros públicos.
"Prevejo que possamos ter as propostas prontas no início de 2006, passada esta fase eleitoral", afirma em entrevista ao semanário, confirmando que já tem apoio do governo para a alteração do Estatuto do TC, essencial para levar a cabo a reforma que prevê no funcionamento do organismo.
Segundo o responsável pela instituição que fiscaliza as contas públicas, entre as mudanças legislativas previstas está o aumento da fiscalização prévia, que permitirá maior controlo da instituição antes da celebração de contratos pelo Governo.
"É indispensável percebermos que o visto prévio (do TC) tem de funcionar, sem margem para qualquer dúvida, como um dos garantes de disciplina orçamental", afirma, acrescentando que uma intervenção "no primeiro momento" da relação contratual que o Estado venha a celebrar com qualquer entidade evita "os factos consumados" e que o tribunal se limite a "decidir vistos e apreciar contratos que já estão em execução".
Outro dos aspectos que o novo responsável pretende mudar é a "articulação e complementaridade do tribunal com o Ministério Público" de forma a "encontrar uma solução que elimine qualquer sentimento de impunidade relativamente à acção do TC".
Para isso, Oliveira Martins propõe a inversão do ónus da prova, de forma que "quem utiliza os dinheiros públicos é que deve mostrar a sua boa utilização" e não, como actualmente, ser o tribunal a provar que houve utilização indevida de verbas.
"Esta questão do ónus da prova não é para perseguir pessoas, é para garantir que o dinheiro público é bem aplicado", sublinha, acrescentando que esta medida prevê a responsabilização dos gestores públicos por o TC ser "um agente activo da defesa dos interesses dos contribuintes".
"O agente público deve demonstrar, não que assegurou um mero interesse patrimonial, mas que garantiu o interesse público" pelo que o "tribunal pode condenar por responsabilização financeira, mesmo que haja contrapartida" para o Estado, explica, adicionando que esta medida exige alterações para abranger "todos os ordenadores orçamentais".
"O nosso objectivo deve ser 'perseguir' o dinheiro público, onde quer que ele esteja e seja quem for que o aplique", disse ainda, salientando que neste sentido está preparado para ser "incómodo para este e outros Governos".
Sublinhando que "o TC não deve ser uma força de bloqueio", mas sim "uma força disciplinadora, independente e incómoda", o novo responsável insistiu que para que a responsabilidade seja efectiva, o "tribunal tem de ser mais oportuno e as decisões têm de ser mais próximas", adoptando também uma "função pedagógica".
"Antes da aplicação das sanções deve alertar, através das auditorias que faz, para os problemas, fazendo recomendações claras e realistas que permitam a sua correcção", disse, acrescentando que quando as recomendações não sejam cumpridas e haja repetição dos erros, "o tribunal tem de ser implacável: deve sancionar e responsabilizar quem repete o erro".
Oliveira Martins garante que "o TC estará com uma atenção redobrada, através dos instrumentos de que dispõe, como as auditorias e a fiscalização prévia dos contratos" a todas as acções que envolvem significativos recursos públicos, quando interrogado sobre empreendimentos como a OTA e o TGV.
"O TC é essencial para pôr em prática uma política de consolidação orçamental", salienta.
O responsável considera que o tribunal "está bem apetrechado tecnicamente" para as alterações e que não será necessário aumentar o número de efectivos, "mas reforçar a sua valia técnica, designadamente através de uma maior articulação com universidades e centros de formação".
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