Uma reforma que não assegura um aumento da celeridade e eficácia da Justiça mas, pelo contrário, abre “brechas inevitáveis”, omite questões fundamentais à investigação criminal e parece procurar “consensos corporativos” sem uma linha de rumo previamente definida, inspirando-se, em algumas situações, em “processos mediatizados envolvendo figuras públicas”.
Estas são apenas algumas das críticas patentes no parecer do Gabinete de Estudos e Observatório dos Tribunais sobre o anteprojecto da revisão do Código de Processo Penal (CPP), elaborado por Fátima Mata-Mouros, antiga magistrada titular do Tribunal Central de Instrução Criminal, José Mouraz Lopes, ex-director do Departamento de Combate à Criminalidade Económica da PJ, e Joaquim Correia Gomes, desembargador na Relação do Porto.A alteração do regime das escutas telefónicas, segredo de justiça, o alargamento dos procedimentos nos reconhecimentos e a limitação do tempo dos interrogatórios são algumas questões que mais dúvidas levantam aos magistrados, designadamente ao nível da aplicação prática. Os juízes falam de uma revisão legítima, mas “maximalista”, cuja quantidade de artigos com proposta de alteração – já aprovada em Conselho de Ministros – “dificilmente não conflitua com alguns dos princípios estruturais que estiveram na origem do CPP”.
Estas são apenas algumas das críticas patentes no parecer do Gabinete de Estudos e Observatório dos Tribunais sobre o anteprojecto da revisão do Código de Processo Penal (CPP), elaborado por Fátima Mata-Mouros, antiga magistrada titular do Tribunal Central de Instrução Criminal, José Mouraz Lopes, ex-director do Departamento de Combate à Criminalidade Económica da PJ, e Joaquim Correia Gomes, desembargador na Relação do Porto.A alteração do regime das escutas telefónicas, segredo de justiça, o alargamento dos procedimentos nos reconhecimentos e a limitação do tempo dos interrogatórios são algumas questões que mais dúvidas levantam aos magistrados, designadamente ao nível da aplicação prática. Os juízes falam de uma revisão legítima, mas “maximalista”, cuja quantidade de artigos com proposta de alteração – já aprovada em Conselho de Ministros – “dificilmente não conflitua com alguns dos princípios estruturais que estiveram na origem do CPP”.
“OMISSÕES INCOMPREENSÍVEIS”
Mata-Mouros, Mouraz Lopes e Joaquim Gomes consideram ainda que há “omissões manifestamente incompreensíveis” na área da investigação criminal, nomeadamente no domínio da obtenção de provas mais adequadas, como a utilização de bases de dados genéticos e localização de pessoas através de equipamentos de telecomunicações: “Há um silêncio tumular sobre este conjunto de questões práticas fundamentais à investigação criminal.”
No caso da inserção dos crimes de corrupção, tráfico de influência e branqueamento de capitais no conceito de criminalidade altamente organizada, os magistrados entendem que há uma “equiparação desproporcionada”. E, dando como exemplo a criminalidade económica, os juízes criticam a restrição imposta para abertura de inquéritos que tenham por base denúncias anónimas. Outro caso que os magistrados dão como exemplo da duvidosa aplicação prática das alterações é, precisamente, a alteração ao regime das escutas, uma das questões mais debatidas. Já no que diz respeito à imposição de um limite de tempo para os interrogatórios judiciais, o parecer é peremptório ao considerar a medida “absurda”.
O documento de 22 páginas já foi remetido ao Ministério da Justiça e aos grupos parlamentares, confirmou ao CM o presidente da Associação Sindical de Juízes Portugueses, que solicitou e aprovou o parecer.
"MEROS ARRANJOS"
O presidente da Associação Sindical de Juízes Portugueses (ASJP), António Martins, admite que o parecer é “bastante crítico”, mas garante que reflecte a posição dos juízes. “Esperamos que seja lido com espírito de abertura para se perceber que as propostas legislativas não são adequadas. Em alguns casos são meros arranjos”, disse o desembargador ao CM, explicando que o documento foi aprovado pela ASJP antes de ser divulgado. Martins considera que as reformas em curso não resolvem o problema da morosidade da Justiça e garante: “Estamos a perder uma oportunidade.”
"ESTOU DESCANSADO"
Rui Pereira, coordenador da Unidade de Missão para a Reforma Penal, reagiu às críticas lembrando que “as soluções foram todas aprovadas por larguíssimo consenso”, tendo estado presentes representantes do Ministério Público, Conselho Superior da Magistratura, das polícias, advogados e vários penalistas. “Mas respeito todas as críticas que as pessoas façam”, disse o jurista ao CM, afirmando que actualmente se trata de matéria assumida pelo Governo, uma vez que a revisão já foi aprovada pelo Conselho de Ministros. “Estou descansado em relação ao produto final”, concluiu.
PARECER
ESCUTAS“
Duvida-se, porém, da possibilidade efectiva de o juiz de instrução proceder ao controlo previsto, desde logo porque exige a audição integral de todas as conversas captadas, o que é praticamente impossível. [...] Em sede de meios conferidos ao juiz para assegurar este controlo, o legislador continua a nada prever. [...] Não é pelas alterações propostas que se notará a diminuição do volume das escutas em Portugal.
”RECONHECIMENTOS“
Questiona-se o alargamento dos procedimentos do reconhecimento efectuado em sede de inquérito e instrução à fase de julgamento. É necessária? É praticável? [...] É incompreensível também a obrigação de realização do reconhecimento no caso de ter havido ‘reconhecimento por fotografia, filme ou gravação’ realizado no âmbito da investigação criminal [...]. Não se entende esta limitação.
”INTERROGATÓRIOS“
Solução absurda e incompreensível [...]. Há interrogatórios judiciais que necessariamente têm de demorar mais tempo. As situações concretas, relacionadas com processos mediatizados envolvendo figuras públicas, onde se visualizaram interrogatórios longos, não podem condicionar a configuração de um acto essencial que na maior parte das vezes não pode estar condicionado em abstracto por horários de secretaria.
”SEGREDO DE JUSTIÇA“
Suscita-se a questão e a dúvida se não se estará a coarctar de alguma forma alguns direitos, também fundamentais, constitucionalmente protegidos, nomeadamente o direito de informar.”
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