Acordo político-parlamentar para a reforma da justiça
A Associação Sindical dos Juízes Portugueses já há muito vinha considerando que as grandes reformas estruturantes do sistema de justiça devem ser objecto de amplo consenso parlamentar e não ficar sujeitas à volatilidade própria das maiorias parlamentares de cada momento, tendo mesmo pugnado pela aprovação de uma lei de planificação para a justiça, com validade plurianual e afectação específica de meios financeiros.
A ASJP considera que o acordo político-parlamentar para a reforma da justiça, assinado hoje pelos grupos parlamentares do PS e do PSD, não pode dispensar a discussão das soluções concretas previstas em cada projecto de diploma, no seu local próprio, que é a Assembleia da República, nem a audição dos representantes das instituições da área da justiça.
Há matérias sobre as quais a Associação teve oportunidade de se pronunciar previamente junto do Governo e dos grupos parlamentares e que merecem apreciação positiva.
Em primeiro lugar, o acordo para resolver o problema do estrangulamento da acção executiva, precisamente porque se trata de matéria da maior importância para o funcionamento dos tribunais, conforme a Associação já tinha comunicado ao Presidente da República, o Governo e os grupos parlamentares, tendo mesmo apresentado publicamente, em Julho, um Relatório Preliminar onde se propuseram soluções agora acolhidas pelos dois partidos com maior representação parlamentar.
Em segundo lugar, no sistema de recrutamento e formação de juízes, o acordo sobre consagração da formação separada de juízes e procuradores e sobre outras propostas apresentadas pela Associação num documento tornado público em Julho passado.
Em terceiro lugar, o acordo sobre a criação do Gabinete do Juiz, com funções de apoio técnico e administrativo, tão necessários para aumentar a qualidade e a produtividade da actividade judicial.
Há, porém, outros aspectos do acordo, em matérias sobre os quais a Associação não teve oportunidade de dar o seu contributo, que merecem sérias reservas.
Na revisão do mapa judiciário, a forma como se prevê a afectação de juízes às novas circunscrições territoriais e a sua mobilidade funcional nos diversos tribunais, não parece salvaguardar os princípios do juiz natural e da inamovibilidade, na medida em que pode abrir caminho para a escolha de juízes para processos ou de processos para juízes, por critérios de oportunidade administrativa, o que é absolutamente prejudicial para os valores da independência e da imparcialidade.
No acesso aos tribunais superiores, concordando embora a Associação de pleno com o princípio da progressão na carreira por critérios de mérito, não compreende a desvalorização do papel do Conselho Superior da Magistratura, que é o órgão com competência constitucional para proceder ao recrutamento e nomeação dos juízes para esses tribunais, substituindo-o por um júri sem a mesma composição plural e democrática daquele Conselho.
No estatuto dos juízes, ainda, a Associação não poderá aceitar que seja desvirtuado o conteúdo do estatuto da jubilação, pois a possibilidade de garantir aos juízes em fim de carreira a manutenção do conjunto dos deveres e direitos equiparado ao dos juízes em efectividade de funções é uma condição essencial para que os cidadãos confiem num desempenho profissional livre, independente e eticamente irrepreensível, ao longo de toda a carreira.
A ASJP reafirma aqui a sua atitude de abertura às reformas do sistema de justiça, direccionadas para a melhoria do seu funcionamento e para a dignificação da função judicial, mas não pode deixar de acentuar a necessidade de tais reformas não desvirtuarem o princípio essencial da independência dos tribunais.
Face à importância das matérias em questão, a direcção nacional da ASJP decidiu solicitar audiências urgentes ao Governo, ao Líder do PSD e aos Grupos Parlamentares e convocar uma reunião extraordinária do Conselho Geral da ASJP para analisar as diversas incidências deste acordo político-parlamentar.
Lisboa, 8 de Setembro de 2006
A Direcção Nacional da ASJP
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