Sobre o Pacto Para a Justiça cozinhado entre o PS e o PSD – ao que parece com o beneplácito presidencial – na opacidade das sedes partidárias, já ouvi o desvairado argumento de que não era razão para alarme porque o fim prosseguido por aqueles partidos – o conseguir impor aos demais partidos com assento na Assembleia da República e aos cidadãos em geral os seus pontos de vista sobre a Justiça (coisa em si mesma legítima) – sempre seria alcançado pelo jogo das maiorias parlamentares. Ou seja, o alarido seria no mínimo supérfluo e traduziria, por assim dizer, uma certa “dor de cotovelo” dos enjeitados.
A miopia deste argumento talvez se alcance melhor com a transposição dele para a própria Justiça em acção. Pense-se, por exemplo, num arguido detido em flagrante num assalto. Nesse caso, de acordo com os nossos pragmáticos dirigentes partidários pactuantes, o juiz e o MP poderiam acordar, tal a evidência de culpa do larápio, em que a pena, digamos de 4 anos de prisão, seria imposta por mero despacho e que o MP não recorreria. Prescindia-se da audiência, que é uma chatice, e das formalidades inerentes. O defensor e o arguido, é claro, ficariam de fora. O Pacto serve não só para evitar os meios que ordinariamente se usam em democracia, mas também para afastar os renitentes da discussão, que é a alma de tal regime. É óbvio, por isso, que se não houvesse renitentes – reais ou potenciais – não havia Pacto, que era desnecessário; mas, como não é menos óbvio, a ausência de renitentes é, não raro, a marca de contraste (e ao menos) da degradação da democracia.
Esta paródia não passa disto mesmo, de uma paródia. Nunca, que eu saiba, na história do nosso regime democrático, quem quer que seja foi condenado sem respeito pelo elementar direito a uma audiência de julgamento. Os nossos juízes, o nosso MP e os nossos defensores parecem ter compreendido desde sempre que, em democracia, os meios não são um pormenor. A qualidade deles dita, em não pouca medida, a legitimidade dos fins.Mas que há paródias na política, lá isso há . . .
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