O acto trivial de retirar uma nota da carteira para pagar uma refeição num centro comercial provocou, há quase sete anos (24 de Novembro de 1999), um dia infernal a uma mulher. O funcionário de um restaurante do Carrefour de Telheiras disse-lhe que a nota de 500 escudos era falsa. Chamou o gerente, que contactou a PSP. A mulher foi identificada e levada para a esquadra. Mas, afinal, a nota era verdadeira. O detector de notas falsas do restaurante é que não estava a funcionar nas devidas condições. Na passada semana, o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) condenou a empresa proprietária do restaurante a pagar à mulher uma indemnização de sete mil euros.Foi preciso chegar ao STJ para que a mulher visse reconhecida a pertinência da acção que moveu contra o restaurante. A primeira instância julgou a acção improcedente, a Relação confirmou a decisão (com um voto de vencido). Os conselheiros do STJ é que não tiveram dúvidas em dar razão à autora da queixa.
A mulher alegou que, perante aquela situação de vexame público, "foi violado o seu direito ao bom nome e integridade moral" e foram violados "preceitos constitucionais referentes a direitos, liberdades e garantias". Argumentou ainda que as "medidas de polícia não podem ser utilizadas para além do estritamente necessário" e que competia ao restaurante "prevenir o mau funcionamento" da máquina detectora de notas falsas. Tudo conjugado, o epi- sódio, que ocorreu à hora de almoço, acabou por prejudicar-lhe o dia: a mulher deveria ter entrado às 15.00 no local de trabalho, mas só às 17.00 desse dia é que saiu da esquadra da PSP.
A empresa proprietária do restaurante contra-alegou argumentando que, pelo menos por duas vezes, foram detectadas notas falsas e que a Polícia Judiciária a aconselhou a contactar as autoridades sempre que detectasse uma suspeita.
Este zelo não teve acolhimento junto dos conselheiros Sebastião Póvoas (relator), Moreira Alves e Alves Velho, que, a 19 de Setembro, decidiram condenar o restaurante a pagar uma indemnização.
E o acórdão é demolidor para a presunção de culpa frequentemente imputada aos cidadãos. "É inadmissível que o utente de um estabelecimento comercial seja vexado, humilhado em público e veja a sua auto-estima ser degradada por uma conduta menos diligente e inconsiderada dos trabalhadores do local".
Para os juízes, a empresa que explorava o restaurante "tinha o dever de o manter em boas condições de funcionamento, em termos de não dar resultados errados". Mais: "Assim, e perante um resultado que apontava para uma nota não autêntica, a conduta do cidadão avisado, e de prudência média, seria abordar a cliente com toda a discrição e cuidado. Nunca, e desde logo, perante todos os outros clientes, provocar a intervenção da polícia, sujeitando a Autora a uma humilhação, desconsideração e incómodos públicos", diz o acórdão de 19 de Setembro.
Para os juízes, a conduta do restaurante "pressupõe que um simples aparelho detector é mais credível do que um cidadão" e que em caso de dúvida "o cidadão é desonesto e prevaricador". E terminam os juízes: "Imagine-se como iria a nossa sociedade se cada cidadão se munisse de um aparelho detector portátil e, quando recebesse o troco num estabelecimento, sempre verificasse a nota, chamando de imediato a polícia para averiguar os empregados se o resultado do controlo não fosse esclarecedor."
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