Alberto Costa, Ministro da Justiça, satisfeito por estar a domar o monstro da Justiça, fica surpreendido com a reacção dos sindicatos. Polémico, considera que defendem posições contrárias ao interesse público e que actuam como organizações políticas. Por isso, diz, deviam ir a votos. Gosta do estilo de Sócrates e não tem dúvidas de que este é mesmo o seu PS.
Correio da Manhã – Quando foi ministro da Administração Interna ficou célebre uma frase sua: “Esta não é a minha polícia.” E esta Justiça? É a sua Justiça?
Correio da Manhã – Quando foi ministro da Administração Interna ficou célebre uma frase sua: “Esta não é a minha polícia.” E esta Justiça? É a sua Justiça?
Alberto Costa – Essa frase nunca foi proferida por mim. Foi-me realmente atribuída, mas o próprio semanário que a publicou como tendo sido minha veio a reconhecer expressamente que não era minha.– Foi um período muito complicado para si, muito difícil mesmo.– Foi um período de mudança, de transformações, de iniciativa, que globalmente marcarou a evolução do sector, mas que também foi uma experiência muito significativa para mim.
– E esta Justiça? O monstro, como lhe chamou. Esta semana afirmou que o monstro começou a ser finalmente atacado. Mas esta Justiça é ou não a sua Justiça?
– É preciso fazer mudanças e transformações neste sector e o Governo está empenhado em fazê-las. Governar é sempre procurar melhorar, introduzir modificações positivas e é nessa linha que temos vindo a actuar. Mas o problema fundamental que referiu é o de na última década ter havido um crescimento constante, à razão de cem mil processos por ano, do volume das pendências, e tornava-se muito importante inverter esse processo, evitar que o monstro continuasse a crescer. E realmente em 2006, em função de um conjunto de medidas, de um plano de combate ao congestionamento dos tribunais, essa tendência inverteu-se e embora a descida não seja tão significativa como desejaríamos, na casa dos cem mil processos, é um sinal de inversão. E se nada tivesse sido feito haveria mais cento e vinte mil processos. Era assim que os últimos anos estavam a correr. É por isso que a mudança é muito animadora, embora exija muito trabalho e persistência para continuar a acentuar-se.
– Mas na última década tomaram-se muitas medidas, tanto pelo PS como pelo Governo do PSD/CDS. Falharam todas?
– Na última década houve planos, houve esforços, houve iniciativas mas que não se traduziram em resultados concretos.
– Mas os números que apresentou são fiáveis?
– São números de um organismo com poderes delegados do Instituto Nacional de Estatística para o sector, são números provisórios e sei que são números estabelecidos com grande prudência, de forma que é bastante possível que os números definitivos sejam bastante melhores.
– Como é que explica a reacção negativa dos sindicatos e da Ordem dos Advogados a esses números? Ficou triste? Desiludido?
– Fico surpreendido. Porque esperaria que sublinhassem os resultados positivos destes resultados e que se associassem a eles, na medida em que resultam, em grande medida, do trabalho de todos os que trabalham nos tribunais. Mas no nosso sector instalou-se há muitos anos uma mentalidade de crise que muitas vezes perturba as reacções às boas notícias, que muitas vezes são consideradas quase como desautorizações das concepções de que se parte acerca da grande crise.
– Também considera, como o seu colega da Economia, que os sindicatos são muitas vezes forças de atraso?
– O que eu considero é que, em certas circunstâncias, posições expressas por essas organizações, que no passado se distinguiram pela sua luta por objectivos altamente meritórios, são desfavoráveis e opostas ao interesse global, ao interesse comum, ao interesse público. E quando assim é, o papel do Governo é não perder de vista o interesse comum em nome da consideração de interesses sectoriais socioprofissionais.
– Não considera que os sindicatos, nomeadamente na área da Justiça, extravasam claramente as suas competências?
– É verdade que frequentemente as tomadas de posição das organizações sindicais fazem pensar que estamos perante organizações políticas que deveriam se submeter a sufrágio para verificar se sim ou não o eleitorado confirma esses pontos de vista. Mas o importante é não confundir o interesse geral com uma interpretação muito restrita e sectorial de certos interesses, eventualmente legítimos, que não devem ser confundidos com o que interessa a todos. É por isso que existe a esfera pública, é por isso que existe a deliberação política democrática.
– O pacto de Justiça firmado entre o PS e o PSD é uma forma de o proteger a si, à sua política e às suas medidas?
– O fundamental era que um conjunto significativo de reformas legislativas fosse aprovado por um consenso alargada no Parlamento e perdurasse para lá de uma legislatura. O que muitas vezes acontece é que as reformas com um suporte político meramente maioritário são muitas vezes alteradas, substituídas nas legislaturas seguintes. Na esfera da Justiça essa falta de continuidade é absolutamente prejudicial, é absolutamente negativa.
– O pacto transformou a excepção do segredo de justiça, defendida pelo PS, numa regra. Foi uma cedência ao PSD?
– O pacto prevê uma redução do âmbito do segredo de justiça. A tendência passa a ser a publicidade e são previstas várias situações em que pode ser levantado. Em caso de conflito de posições entre vítima e Ministério Público será o juiz a decidir se aplicará ou não esse regime. O que passa a ficar esclarecido é que o segredo de justiça, nos casos em que se aplica, vincula não só as partes que têm contacto directo com o processo como também aqueles que contactam com elementos constantes do processo.
– Mas um jornalista que esteja a investigar uma universidade, por exemplo, sem saber que a mesma está a ser objecto de investigação policial, pode ser acusado de violação do segredo de justiça?
– Se não tem contactos com elementos do processo não está abrangido pelo que está previsto para o segredo de justiça.
– No âmbito do combate à corrupção, o pacto não prevê que o ónus da prova sobre as grandes riquezas seja do cidadão. Não acha que seria uma medida eficaz?
– O problema está em saber se num Estado de Direito se pode, e em Portugal seguramente não pode, instituir um crime que anule a presunção de inocência e que ponha a cargo do arguido a demonstração de que não tem culpa. – Mas há países que o contemplam.
– Alguns países, aliás, poucos, têm situações diferentes. Tal como foi proposto, esse crime era, até do ponto de vista das penas, equiparado à corrupção. No caso de não existir essa justificação, incorrer- -se-ia num ilícito penal com uma punição análoga à prevista para a corrupção. Em todo o caso nada disto impede que sejam encontradas soluções de natureza fiscal, como Jorge Sampaio propôs há já alguns anos.
– O procurador-geral da República afirmou que a nomeação de Maria José Morgado para o caso ‘Apito Dourado’ deu um novo impulso no combate à corrupção. Concorda?
– Eu aplaudi essa iniciativa, pareceu-me uma boa escolha e verifiquei que um grande número de pessoas concordou com essa nomeação. Acho que as escolhas personalizadas em áreas tão difíceis como é a da corrupção, a exemplo do que se passa em Espanha, por exemplo, melhoram a visibilidade e tornam esse combate mais eficaz.
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– A revisão do mapa judiciário é para fazer nesta legislatura ou ficará para mais tarde?
– Está previsto que até final do ano a Assembleia da República aprove a lei que promoverá a revisão do mapa judiciário e em 2008 começará a sua implementação.
– Essa revisão levará ao fecho de alguns tribunais?
– O que nós propomos é que exista uma nova forma de funcionamento em circunscrições mais alargadas e que os respectivos tribunais tenham uma presidência única. Não estamos a prever que haja extinções de tribunais. Devem existir é ajustamentos em função do movimento efectivo em cada circunscrição.
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