Os juízes negam o "extraordinário" aumento da produtividade dos tribunais na segunda quinzena de Julho e primeira de Setembro de 2006 - que o ministro da Justiça, sem ter mostrado um estudo, garante ter sido de 57,3% comparativamente a 2005, quando aquelas duas quinzenas ainda se integravam as férias judiciais.
O Conselho Superior da Magistratura (CSM) fez o levantamento do trabalho judiciário naqueles períodos - que em 2006 passaram a tempos de trabalho normal com a entrada do novo regime das férias - e constatou que em todos os distritos judiciais o número de diligências "foi muito reduzido", e com "muita perturbação".
O relatório, a que o DN teve acesso, foi enviado a Alberto Costa em Fevereiro, salientando-se que quase só o serviço urgente foi assegurado."As diligências realizadas reduziram-se às necessárias para terminar audiências de julgamento em curso ou às de natureza urgente, o que sempre ocorreria neste ou no anterior regime de férias judiciais", lê-se no relatório relativamente ao distrito judicial do Porto. Muitos foram os magistrados da região que interromperam as férias para assegurar a distribuição de novos processos, e o despacho de processos urgentes. "Os juízes que viram afectadas as férias não reclamaram o exercício ulterior do correspondente direito", afiança-se.
Outros juízes tiveram de pôr o seu serviço de lado para poderem substituir colegas de férias. "Isto traduziu-se na indisponibilidade de tempo para proferir despachos de fundos em processos complexos", disseram os magistrados do Norte.
Este panorama foi o espelho do resto do País. Relativamente ao distrito Judicial de Lisboa, salienta-se: "Os tribunais deixaram de funcionar normalmente a partir da primeira semana de Julho até à segunda semana de Setembro." Exemplificando: em Sintra não houve diligência marcadas; em Vila Franca de Xira "uma juíza assegurou, sozinha, os tribunais Cível, Crime e Instrução, Trabalho e Família"; no Tribunal de Instrução Criminal "nem o serviço urgente foi assegurado"; no Seixal, "o sistema funcionou porque os juízes abdicaram de gozar 22 dias de férias seguidos". O esforço exigido aos juízes que não se encontravam em férias, e que tiveram de substituir os restantes, foi enorme. "Em várias situações, um juiz teve de substituir seis, sete ou oito de várias jurisdições". Também no distrito judicial de Coimbra, tal como no de Évora, "excluídos os processos urgentes, foram em número diminuto as diligências singulares realizadas nas comarcas e juízos", afirma-se no relatório enviado a Alberto Costa, onde também se lê: "Os processos que não eram urgentes não foram despachados", além de que "foi diminuto o número de diligências e julgamentos levados a cabo - quer porque não foram marcados, quer porque, em menor número, foram adiados".
Os magistrados de Coimbra garantem que "na maior parte dos círculos não houve um julgamento marcado naqueles dois períodos".
Então, como se justifica o aumento de produtividade nos tribunais na ordem dos 57,3%? O Ministério da Justiça diz que o levantamento foi realizado pelo Gabinete de Política Legislativa e Planeamento, dependente do seu ministério, frisando tratar-se de dados reconhecidos pelo Instituto Nacional de Estatística. Os vários operadores judiciários nunca viram aquele estudo, e mostram-se desconfiados (ver reacções).
António Martins, da Associação Sindical de Juízes Portugueses, lembra que, em 2005, ao abrigo do regime de férias então em vigor, na segunda quinzena de Julho e primeira de Setembro só as diligências urgentes eram realizadas. Em 2006, com o novo regime, passou a realizar-se trabalho normal naquele período. Assim, evocar um aumento de produtividade de um ano para outro é "comparar o incomparável", afirmou.
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