Cada português paga 430 euros por ano para financiar os gastos com os gabinetes do Governo. São os salários dos assessores, os pedidos de pareceres e a contratação de especialistas. Tudo feito sem controlo. O Tribunal de Contas quer acabar com a anarquia.
Os números são esmagadores. Em três anos (2003 a 2005) a despesa total movimentada pelos gabinetes do Governo atingiu o valor de 12,8 mil milhões de euros, sendo que só as despesas de funcionamento (aquelas que permitem que os ministérios trabalhem no seu dia-a-dia) totalizaram 216,3 milhões de euros. Só para se ter uma ideia, os gastos dos ministérios davam para construir três aeroportos da Ota e uma dezena de pontes iguais à Vasco da Gama.
Os números são esmagadores. Em três anos (2003 a 2005) a despesa total movimentada pelos gabinetes do Governo atingiu o valor de 12,8 mil milhões de euros, sendo que só as despesas de funcionamento (aquelas que permitem que os ministérios trabalhem no seu dia-a-dia) totalizaram 216,3 milhões de euros. Só para se ter uma ideia, os gastos dos ministérios davam para construir três aeroportos da Ota e uma dezena de pontes iguais à Vasco da Gama.
Se dividirmos os 12,8 mil milhões por três anos (4,3 mil milhões) e o distribuirmos por dez milhões de habitantes, verificamos que, em média, cada português teve de pagar do seu bolso 430 euros por ano para financiar o funcionamento dos gabinetes do Governo. Estamos a falar em despesas que dizem respeito a ordenados com assessores, chefes de gabinete, pagamento de pareceres e contratação de especialistas.
Mas a vertente financeira é apenas uma parte do problema. A verdade é que existe um total descontrolo na actividade dos 205 gabinetes governamentais que foram auditados pelo Tribunal de Contas e que empregaram 1303 assessores, técnicos, consultores e especialistas durante três anos.
“É a primeira vez que o Tribunal de Contas realiza uma auditoria aos gabinetes dos ministros, o que se revelou do maior interesse e certamente permitirá contribuir para o aperfeiçoamento do regime de funcionamento” dos mesmos, afirmou ao CM uma fonte do Tribunal.
A auditoria ontem divulgada é particularmente crítica em relação à falta de rigor com que são registadas as despesas e as contratações de funcionários que prestam serviço nos gabinetes ministeriais.
Não existe qualquer informação estatística respeitante ao pessoal que presta serviço nos gabinetes dos ministros, nem se sabe em que qualidade os colaboradores exerciam as suas funções. A informação enviada ao Tribunal é muito deficiente e a existência de várias discordâncias entre os números inscritos na Direcção-Geral do Orçamento e as contas feitas nos vários ministérios coloca em causa a veracidade dos números. Por último, mas não menos grave, existe uma falta de rigor na elaboração e publicação em Diário da República dos despachos de nomeação e de exoneração dos assessores que trabalham para o Governo.
Mas a verdade é que nos governos liderados por Durão Barroso, Santana Lopes e José Sócrates foram contratados assessores sem limites pré-fixados, com critérios de selecção nem sempre claros e com remunerações atribuídas sem ter em conta as funções para as quais foram contratados. O Tribunal de Contas fala de colaboradores a ganharem mais do que o próprio ministro a quem foram ajudar e alguns com ordenados superiores ao do primeiro-ministro.
Para acabar com este estado de coisas, a instituição liderada por Guilherme d’Oliveira Martins recomenda que se estabeleça um limite máximo para o número de colaboradores por gabinete, que se fixem as remunerações do pessoal e, já na proposta de Orçamento do Estado para 2008, se elimine a prática de inflacionar os orçamentos dos gabinetes dos ministros de modo a parar as transferências para entidades privadas.
O ALERTA DE FREITAS
A polémica em torno dos gastos dos gabinetes nasceu na sequência de uma declaração polémica atribuída a Freitas do Amaral, que disse que o Estado pagou 250 milhões de euros em pareceres e estudos económicos no Governo de Durão Barroso. Mais tarde, Alfredo de Sousa decidiu avançar com a auditoria e também o deputado António José Seguro pediu informação sobre a matéria.
SÓCRATES FOI QUEM MAIS NOMEOU: AUDITORIA ATRIBUI-LHE 148 ESCOLHAS DE PESSOAL
José Sócrates foi o primeiro-ministro do triénio em causa que mais nomeações fez para o seu gabinete. O Tribunal de Contas imputa-lhe 148, enquanto Santana Lopes tem 80 e Durão Barroso 62.“Foi no gabinete de um primeiro-ministro que se registou o valor mais elevado de admissões (148), entendidas estas como o número de pessoas que desempenharam funções num só gabinete, a qualquer título (no quadro e além do quadro), mas independentemente da duração da sua permanência”, escrevem os auditores.
Mas Sócrates não fica sozinho. São registados outros casos de dois gabinetes com 108 e 72 admissões.
Os auditores são particularmente críticos em relação a “desconformidades” que apontam face à lei: “152 elementos em comissão de serviço integraram, incorrectamente, uma estrutura de apoio técnico de um ministro, não identificado no documento, e duas figuras atípicas com a designação de ‘conselheiro Roma’ e ‘gestor POAGRO’ em gabinetes de três ministros, de um mesmo ministério, repartidos, pois, pelos três governos analisados.”Estas duas últimas figuras, ‘conselheiro Roma’ e ‘gestor POAGRO’, não se enquadram nos cargos e funções previstos mas têm salários superiores aos do primeiro-ministro. Por fim, são identificadas centenas de nomeações sem cabimento legal.
O QUE DISSERAM EM SUA DEFESA
NOBRE GUEDES (Ex-ministro do Ambiente)
O antigo ministro do Ambiente do Governo de Santana Lopes, Nobre Guedes, adianta que em matéria de pagamentos tudo era tratado pela Secretaria-Geral do Ministério e acredita que tudo foi feito com suporte legal e dentro das regras definidas.
JORGE LACÃO (Subsecretário de Estado)
Assumindo a defesa do Governo socialista, Jorge Lacão refere que a contratação dos 148 colaboradores para o gabinete do primeiro-ministro englobava 50 assessores herdados do Executivo de Santana Lopes e também os trabalhadores da residência oficial.
CARLOS TAVARES (Ex-ministro da Economia)
Ministro da Economia no Governo de Durão Barroso, Carlos Tavares considera “absurdos” alguns reparos do Tribunal, nomeadamente no que se refere ao limite dos adjuntos que, aquele responsável diz ter sido ultrapassado apenas “durante um dia”.
M. J. BUSTORFF (Ex-ministra da Cultura)
Pertencente ao Governo de Santana Lopes, Maria João Bustorff alega que grande parte do orçamento do seu ministério estava canalizada para o Centro Cultural de Belém e para a Casa da Música. Diz ainda que utilizou a classe económica em voos comunitários.
CELESTE CARDONA (Ex-ministra da Justiça)
A responsável pela Justiça no Governo de Durão Barroso defende-se afirmando que não conhece os elementos constantes do relatório, mas que as suas decisões tiveram sempre base nos documentos de suporte que lhe foram dados pelos serviços do Ministério.
M. G. CARVALHO (Ex-ministra da Ciência)
Ex-ministra da Ciência nos Governo de Durão Barroso e Santana Lopes, defende-se dizendo que conhecia e estavam registados todos os elementos que constituíam o seu gabinete e que os colaboradores aposentados auferiam remunerações mais baixas.
NÚMEROS
37,9 milhões de euros foi quanto os três governos pagaram por estudos, pareceres e projectos a empresas de consultores e escritórios de advogados.1303 Foram os funcionários recrutados pelo valor de 20,9 milhões de euros, numa amostragem feita em 30 gabinetes dos três executivos.2 gabinetes ministeriais são responsáveis pela contratação de um conjunto de 180 funcionários entre os que estão no quadro e além dele.2002 é a data em que foi aprovada uma deliberação para moralizar benefícios suplementares que nunca foi publicada.
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